Exasperada pelo aumento dos custos de assinatura cobrada por editoras acadêmicas, a Universidade de Harvard tem incentivado os membros do seu corpo docente para tornar seus resultados de pesquisa disponíveis livremente através de periódicos de acesso aberto e evitar publicações por assinatura.

Um memorando da Biblioteca Harvard (external link) enviado a 2.100 docente e pesquisadores da universidade adverte que não pode mais arcar com os aumentos de preços impostos pelos maiores publishers, que custam à biblioteca cerca de US $ 3,5 milhões por ano.

O movimento extraordinário move uma das instituições mais ricas e prestigiosas do mundo ao centro de um debate cada vez mais preocupante sobre o acesso aos resultados da pesquisa acadêmica, que é principalmente financiado pelos contribuintes.

O resultado da decisão de Harvard para controlar os publishers será observado de perto por grandes universidades no mundo e pode levar outras instituições a seguir o exemplo.

O memorando do conselho consultivo de Harvard disse que os principais publishers haviam criado uma "situação insustentável" na universidade, tornando a interação acadêmica "fiscalmente insustentável" e "academicamente restritiva", enquanto auferem lucros de 35% ou mais. Preços para acesso on-line para artigos de dois grandes publishers aumentaram 145% nos últimos seis anos, com alguns periódicos custando até US$ 40.000/ano, diz a nota.

Mais de 10.000 acadêmicos já se juntaram ao boicote à Elsevier (external link), a enorme editora holandesa, em protesto contra as suas políticas de preços e de acesso aos periódicos. Muitas bibliotecas universitárias pagam mais do que a metade de seus orçamentos para periódicos às editoras Elsevier, Springer e Wiley.

Robert Darnton, diretor da biblioteca de Harvard disse ao Guardian: "Eu espero que outras universidades tomem medidas semelhantes Todos nós enfrentamos o mesmo paradoxo. Nós realizamos a pesquisa, escrevemos os artigos, atuamos como peer reviewers nos artigos de outros pesquisadores, atuamos em conselhos editoriais, tudo isso de graça... e então temos de comprar de volta os resultados de nosso trabalho a preços exorbitantes”.

"O sistema é um absurdo, e está infligindo danos terríveis às bibliotecas. A taxa de subscrição de um ano para o periódico The Journal of Comparative Neurology custa o mesmo que 300 monografias. Nós simplesmente não podemos continuar a pagar o aumento dos preços de assinaturas. A longo prazo, a resposta será a publicação de periódicos de acesso aberto, mas precisamos de esforço concertado para alcançar este objetivo. "

No sistema tradicional de publicação de periódicos, pesquisadores enviam artigos para editores que os enviam para avaliação por pares, uma tarefa que tipicamente é não remunerada. As versões finais dos artigos são, em seguida, formatadas e vendidas de volta para as bibliotecas universitárias. O acesso aberto se apresenta de várias formas, mas um determinado modelo requer que os autores paguem uma taxa para ter seus artigos publicados e disponibilizados gratuitamente a todos.

De acordo com o memorando de Harvard, assinaturas de periódicos são agora tão elevadas que mantê-las seria "erodir seriamente os esforços de cobrança em muitas outras áreas, já comprometidos". A nota pede aos membros do corpo docente para encorajar as suas organizações profissionais para assumir o controle da publicação acadêmica, e considerar submeter seu trabalho a periódicos de acesso aberto, além de abandonar conselhos editoriais de periódicos que não são de acesso aberto. O documento acrescenta ainda que a biblioteca deve insistir em contratos transparentes que impeçam as universidades de discutir em público as taxas que pagam a certos publishers.

Em uma declaração ao The Guardian, a Elsevier disse: "A carta do Conselho Consultivo da Universidade Harvard não especifica qualquer publisher especificamente. Temos um bom relacionamento com as bibliotecas de Harvard e acabamos de concluir recentemente um acordo o qual acreditamos que funciona para eles, pois lhes dá flexibilidade para escolher os títulos que quiserem.

"Nós não acreditamos que os fatos na carta que dizem respeito a aumentos de preços referem-se à Elsevier. Os aumentos médios na lista de preços da Elsevier têm sido consistentemente entre os mais baixos da indústria para os últimos anos, com uma média em torno de 5%."

A declaração concluiu: "Nós acreditamos que Harvard vai continuar a perceber o valor da publicação em periódicos Elsevier, que incluem uma gama de opções de acesso, e contribuindo como editores destes periódicos."

David Prosser, diretor executivo da Research Libraries UK (RLUK), disse: “Harvard tem uma das bibliotecas mais ricas do mundo. Se Harvard não pode se dar ao luxo de comprar todos os periódicos que seus pesquisadores necessitam que esperança têm o resto de nós?”

"Sempre houve um problema com que isso fosse visto como uma questão de orçamento da biblioteca. O memorando de Harvard deixa claro que é maior do que isso. É no coração da educação e da pesquisa. Se você não pode ter acesso à literatura, isso afeta a pesquisa".

A RLUK tem negociado novos contratos com a Elsevier e a Wiley no ano passado, depois que o grupo ameaçou cancelar grandes assinaturas com estes publishers. O novo acordo, organizado em nome de 30 bibliotecas-membro, deve permitir uma economia às bibliotecas do Reino Unido de mais de £ 20 milhões.

"A melhoria de ofertas nos deu um espaço para respirar, porém não resolve o problema. Há um problema estrutural de longo prazo com este mercado que não vai ser resolvido assim simplesmente", afirmou Prosser.

Heather Joseph, diretora-executiva da Scholarly Publishing and Academic Resources Coalition (SPARC (external link)), uma organização internacional de bibliotecas-membro com sede nos EUA, disse que outras universidades poderão seguir o exemplo de Harvard.

"Destacando o papel do corpo docente é exatamente o que precisamos fazer. As bibliotecas têm tentado alertar sobre isso há tempos, mas são os membros do corpo docente que são os produtores e consumidores de artigos. Eles têm nas mãos as chaves para fazer a mudança significativa neste mercado. A atitude de Harvard, chamando a atenção dos pesquisadores, é um movimento muito significativo."

Joseph acrescenta: "Outras universidades tendem a seguir o exemplo de Harvard neste tópico. Se tem início em uma universidade com a estatura de Harvard, elas vão ver se isso é algo que faz sentido para eles também. As pessoas estão atentas à Harvard. Não há nenhuma área cinzenta lá.”

Fonte: The Guardian (external link)